quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

O olho de Deus

   Não consigo esquecer, não posso e não quero esquecer algo fantástico que aconteceu comigo e que está mudando tudo.

   Estávamos eu e o meu marido a bordo do navio fazendo o cruzeiro, navegávamos na região de Abrolhos, conhecida pelas baleias que vivem lá, sempre foi um sonho poder vê-las, e naquela noite deixamos as crianças irem dormir na cabine dos meus pais e fomos curtir a noite animada e fresca.
   Passeando no andar mais baixo a que tinhamos acesso, num longo deck que contornava todo o navio, num determinado momento nos debruçamos e ficamos encantados olhando o mar, noite escura e o mar calmo, mas havia sim ondas e balanços. Estávamos muito maravilhados com aquela imensidão, eu não conseguia desgrudar meus olhos daquele mar, vez por outra via nuances, sombras e contornos do que parecia ser algum peixe enorme que só mostrava uma pequena parte do dorso. Fiquei muito excitada com tudo aquilo, e meu marido que usa óculos, irritado e descrente não conseguia ver nada, eu lhe mostrava e ele pouco conseguia ver. Num determinado momento eu lhe disse que podia ver algo como duas baleias, nesse momento ele já ria de mim, mas eu realmente via isso, ainda que mal acreditasse em mim mesma, no dia seguinte já no Rio de Janeiro, após o café da manhã o comandante avisou a todos pelo sistema de auto-falantes que duas baleias estavam visíveis do lado direito do navio, soube na hora que eram elas, as mesmas que eu tinha visto nesta noite.

   Ele não parava de falar, nem sei o que dizia agora, percebia as coisas que estavam acontecendo ali, tudo o que eu estava vendo e ficava cada vez mais concentrada tentando entender o que via. Foi quando eu vi o olho, posso dizer isso porque era somente isso mesmo, um olho, grande, redondo e negro, olhando fixamente para mim. Minha barriga abriu-se num buraco profundo onde só havia vento frio, minha respiração parou por um tempo que não sei, não consegui falar nada, não ouvia o que ele me dizia, mas olhei fixamente para o olho que se fazia ver por sobre as ondas, num dorso negro com alguns calos, protuberâncias e pêlos. Dizer que foi forte é dizer o mínimo, minhas pernas ficaram bambas, não consegui comentar, não consegui falar, e só falei sobre isso com meu filho ontem, enquanto estava no quarto junto com meu marido, que perguntou-me se ela também deu tchau com uma das nadadeiras, eu o ignorei e contei o fantástico para o meu filhote que acreditou em mim logo de cara, meu marido percebendo a seriedade do relato e conhecendo-me um pouco, olhou-me intrigado e não disse mais nada, ainda me pergunto se ele acredita em mim, mas é verdade, por tudo o que me é mais sagrado, é verdade.
   Após a visão, sem conseguir desgrudar os olhos, vi a silhueta escura sob a água afastando-se.
   Foi Deus que olhou pra mim, Deus em forma de baleia, o olho maior e mais lindo que já vi na vida, mas acima de tudo o mais atento olho que já tive sobre mim.

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